O bairro de Bento Ribeiro é lembrado popularmente por ter revelado o futebol de Ronaldo, “o fenômeno”. Também, por ter sido morada da apresentadora Xuxa Meneghel. A história do local, no entanto, vai muito além disso e mostra uma forte ligação com a cultura popular brasileira.
Nomes como Pixinguinha, Cartola, Paulo da Portela e Heitor dos Prazeres, além do poeta popular Raimundo Santa Helena – considerado um dos fundadores culturais da Feira de São Cristóvão –, frequentaram e/ou viveram na localidade.
Bento Ribeiro está localizado na Zona Norte do Rio. Faz divisa com Marechal Hermes, Honório Gurgel, Oswaldo Cruz, Vila Valqueire e Rocha Miranda. Pertence à Região Administrativa de Madureira.
A denominação, delimitação e codificação do bairro foi estabelecida pelo Decreto Nº 3158, de 1981 (com alterações do Decreto Nº 5280/1985).
“Quem pensa em Bento Ribeiro, pensa em tranquilidade. Além disso, o bairro tem uma história ligada à cultura, ao samba, ao carnaval, embora isso tenha se perdido hoje em dia”, conta Fábio dos Santos Cézar, morador da região há quase 40 anos, criador e editor da página Bento Ribeiro Memória e Cultura, no Facebook.
A página foi criada em 2017 e possui mais de 1300 seguidores. O objetivo de Fábio, que é professor de Língua Portuguesa e Literatura na Rede Pública Estadual de Ensino, é compartilhar com moradores suas pesquisas sobre o bairro.
“Minha intenção é reunir e divulgar informações inéditas. Não retiro de sites. Faço pesquisas em periódicos, revistas e jornais. Sempre que encontro algo curioso, publico”, explica.
A história do bairro de Bento Ribeiro
O bairro de Bento Ribeiro se formou ao longo das ruas João Vicente e Carolina Machado. Com a implantação da estrada de Ferro Dom Pedro II, foi inaugurada em 1914 a estação Prefeito Bento Ribeiro. De lá, partia o antigo ramal do Campo dos Afonsos, desativado por volta de 1960.
Como em muitas localidades do subúrbio, a estação de trem corta o bairro. Seu nome foi uma auto-homenagem de Bento Manuel Ribeiro Carneiro Monteiro, general e prefeito da cidade entre 1910 a 1914 (durante o governo do Marechal Hermes da Fonseca).
Segundo Fabio Cézar, até pelo menos um ano antes da inauguração da estação, a então parada de trens era chamada Mario Hermes, nome de um dos filhos de Marechal Hermes.
Uma fonte localizada nas proximidades da Estrada Real de Santa Cruz (atual Intendente Magalhães) e muito usada pelos viajantes, deu origem à estrada da Fontinha.
Na época, a região do atual bairro já era consideravelmente povoada., Além da população vinda do Centro após a reforma urbana de Pereira Passos, imigrantes portugueses e italianos habitavam o local
“As terras da região eram das antigas fazendas de Sapopemba e de Boa Esperança, que foram loteadas e adquiridas por imigrantes a preços baixos, por não estarem na região central da cidade. Eles construíram imóveis e dominaram o comércio. Muitos açougues, padarias, armazéns e armarinhos pertenceram a portugueses, por exemplo”, conta Fábio Cézar.
Bento Ribeiro: samba e carnaval
O bairro de Bento Ribeiro já sediou duas escolas de samba, além de outras agremiações e blocos carnavalescos. A Lira do Amor foi uma delas. Disputou o carnaval entre as mais tradicionais e foi presidida por Paulo da Portela, quando o compositor deixou a escola de Oswaldo Cruz.
Além dela, houve a Paz e Amor, que teve Heitor dos Prazeres como um importante membro.
A música brasileira foi destaque, também, no Edifício/ Clube Cedofeita, que funcionou entre as décadas de 1930 e 1960, segundo Fábio Cézar. O local sediava uma gafieira chamada Linda Luz Parque Dancing.
O Cedofeita recebeu apresentações de Pixinguinha e foi frequentado por grandes nomes do samba, como Cartola e Zé Keti, que também moraram no bairro.
“Com o passar dos anos, o clube foi associado à malandragem, ao submundo e sendo mal visto por uma parcela da população. Era uma casa popular, voltada a um público mais pobre e, predominantemente, negro”, conta o pesquisador.
O edifício fica localizado entre as ruas do Queimado, Apodi e Gita. No local, hoje funciona uma academia de ginástica.
Vozes femininas, literatura de cordel e cinema
Além dos nomes do samba, vozes femininas que fizeram sucesso na Era do Rádio também marcam a história de Bento Ribeiro.
No bairro, nasceram as cantoras Marion Duarte e Miracy de Barros, ambas atualmente com 82 anos, que se destacaram nas décadas de 1950 e 1960.
O poeta paraibano Raimundo Luiz do Nascimento, mais conhecido como Santa Helena, destaque na literatura de cordel, foi outro morador ilustre do bairro. Atuante, conta-se que ele escrevia cartas aos jornais solicitando melhorias para a região.
Santa Helena foi um dos fundadores culturais da Feira de São Cristóvão. A Casa de Rui Barbosa reúne informações sobre a história e a obra do cordelista, que faleceu em 2018, aos 92 anos.
Ainda no campo das Artes, o bairro de Bento Ribeiro já abrigou dois cinemas. O Cine Bento Ribeiro, na década de 1930, e o Cine Caiçara, que funcionou até os anos 1980.
“Atualmente, igrejas ocupam o espaço desses antigos cinemas, o que é um fenômeno dos subúrbios cariocas”, avalia Fábio Cézar.
História do Rio: um resgate do subúrbio
O professor Fábio dos Santos Cézar escreveu um romance autoficcional ambientado em Bento Ribeiro. O livro ainda não foi publicado. Fábio planeja, ainda, produzir um documentário sobre a região, com relatos da população.
O resgate da história dos bairros da cidade, sobretudo os do subúrbio, vem sendo feito por muitos moradores, pesquisadores e curiosos, que divulgam o material em páginas criadas no Facebook.
Os registros levam conhecimento, não apenas a moradores, mas a todos os amantes da História do Rio.
Fontes:
Instituto Pereira Passos
Fundação Casa de Rui Barbosa
Dicionário Cravo Albin de Música Popular Brasileira