Laranjeiras é o bairro do Rio de Janeiro que abriga as sedes do governo do estado – o Palácio Guanabara, antiga residência oficial da Princesa Isabel e do Conde D’Eu – e do Fluminense Football Club. É lá que também fica o Parque Guinle e o centro de referência nacional na área de surdez, o Instituto Nacional de Educação de Surdos.
Outrora, foi área de plantio de produtos de subsistência e de residência das famílias mais abastadas da cidade. Hoje, no século XXI, é lugar de morada da classe média e um dos principais pontos de ligação entre as zonas Norte e Sul da cidade. É também ponto de encontro de algumas manifestações culturais, como o choro carioca, graças a seus grupos de músicos que tocam a céu aberto, tanto na Praça São Salvador como na Rua General Glicério.
Com cerca de 45 mil habitantes, segundo o Censo de 2010, o bairro tem a Rua das Laranjeiras como via principal. Ela se inicia no Largo do Machado e se estende até a Rua Cosme Velho, rasgando o vale formado pelos morros do Corcovado, Dona Marta, Mundo Novo e Prazeres. Por baixo dela corre o Rio Carioca, hoje canalizado e invisível à população, mas que, até a chegada da família real portuguesa, foi a principal fonte de abastecimento de água da cidade.
Povoamento
A ocupação da várzea do Rio Carioca data dos primórdios da colonização do Rio de Janeiro. Grandes chácaras rústicas margeavam o curso d’água e produziam frutas e verduras, que eram levadas de canoa até o Mercado do Peixe, na Praça Quinze, principal ponto comercial de produtos de subsistência dos cariocas, até o início do século XX.
Quando o Rio de Janeiro se transformou em capital da colônia, na segunda metade do século XVIII, as chácaras já haviam se transformado em residência de famílias ricas e fidalgas. E com a explosão populacional que a cidade sofreu, em função da chegada da Corte portuguesa, a ocupação de Laranjeiras se acelerou. Junto com Catete, Flamengo e Botafogo, tornou-se um dos lugares mais procurados pelos novos habitantes, gerando um processo de fracionamento das terras.
No início do século XIX, uma das maiores chácaras do bairro era a Ilhota, de José Antônio Lisboa, futuro ministro da Fazenda de D. Pedro I. A propriedade ficava nas imediações da atual Rua Cardoso Júnior. Em frente, ficava a residência da Duquesa de Cadaval, onde, mais tarde, se instalou a Embaixada da Itália e, depois, o Instituto Italiano de Cultura.
Muitos outros ilustres moraram em Laranjeiras, no decorrer dos séculos XIX e XX, como o Conde de Lajes, o médico Moura Brasil, os engenheiros Pereira Passos e Buarque de Macedo, o comendador Rocha Faria, a Princesa Isabel e o Conde D’Eu, o poeta Olavo Bilac, o banqueiro Eduardo Guinle, o diplomata e compositor Vinicius de Moraes...
Mudando as feições
Na década de 1880, foi inaugurada na Rua Francisco Glicério (atual General Glicério), a Companhia de Fiações e Tecidos Aliança, uma das maiores do país, com mais de mil operários. Segundo o historiador Nireu Cavalcanti, a fábrica mudou a arquitetura e a urbanização de Laranjeiras, além da composição de sua população.
Em seu terreno, foi construída uma vila operária (existente até hoje, na Rua Cardoso Júnior) e, a partir dela, começaram a aparecer outras casas de porta e janela, além de um comércio de produtos de subsistência.
Com o fechamento da fábrica, em 1937, seus terrenos foram fracionados em um loteamento chamado de Jardim Laranjeiras. Na General Glicério, nas proximidades da Rua Belizário Távora, surgiu um conjunto de edifícios altos, afastados uns dos outros e da via pública por jardins. Um deles desabou em 1967, em função de fortes chuvas que causaram deslizamento de terras e pedras do Morro Mundo Novo.
Muitos moradores morreram, entre eles Paulo Rodrigues, irmão de Mário Filho e Nelson Rodrigues.
Ligação Norte-Sul
De acordo com o historiador e jornalista Brasil Gérson, a Rua Alice foi aberta, no último quarto do século XIX, pelo empresário Eduardo Kinglhoefer, que queria construir uma linha de bondes interligando a Zona Sul à Zona Norte, através de um túnel: o Rio Comprido-Laranjeiras.
A via foi aberta e o túnel, o primeiro da cidade, inaugurado em 1887. Mas nunca nenhuma linha de bonde por ele passou, muito embora tenha se tornado uma alternativa para quem queria ir da Zona Norte à Zona Sul de carro, sem passar pelo Centro.
Na década de 1940, o traçado sinuoso da Rua Alice, margeando a encosta do Morro dos Prazeres, não comportava mais a demanda de tráfego da cidade, em função do aumento da frota de veículos.
Durante a gestão do prefeito Mendes de Moraes (1947-1951) foi feito o projeto de construção do Túnel Santa Bárbara (Catumbi-Laranjeiras), só concluído em 1963.
Dois anos depois seria inaugurado o Túnel Rebouças, facilitando o trânsito entre o bairro e a Lagoa Rodrigo de Freitas.
Escolas centenárias
A maior parte das ruas mais antigas do bairro ficam próximas ao Catete, a exemplo da Rua Gago Coutinho, aberta em 1837 em terras de Domingos Carvalho e Francisco Marcos Leão, também doadores do terreno da Igreja de Nossa Senhora da Glória, no Largo do Machado.
A Rua Ipiranga, onde o escritor Lima Barreto e o maestro Villa-Lobos nasceram, é outro exemplo. Durante o século XIX abrigou o Colégio Abílio, um dos mais renomados na Corte. Foi nele que Raul Pompeia estudou e se inspirou para escrever o romance O Ateneu. Em 1883, a Associação Promotora da Instrução abriu a Escola da Glória, na Rua Esteves Júnior, cujo prédio foi adquirido pela Prefeitura, em 2003, e transformado na E.M. Senador Corrêa.
Laranjeiras tem outras escolas com histórias centenárias, como o Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines), fundado em 1857 com o nome de Imperial Instituto dos Surdos-Mudos. Foi o Ines que desenvolveu a Língua Brasileira de Sinais (Libras). Em 1904, foi criada, no bairro, a Maternidade-Escola da Universidade Federal do Rio de Janeiro, uma das mais importantes no ensino de Obstetrícia do país.
Mercado e carnaval
Na esquina da Rua Gago Coutinho com a das Laranjeiras, fica o Mercado São José. Especula-se que ele foi usado como uma baia de cavalos ou uma senzala, durante o período monárquico.
Transformado em espaço cultural e de lazer em 1988 e tombado em 1994, teve suas dependências requeridas pelo INSS, e hoje encontra-se fechado.
Foi nele que foi fundado o bloco Imprensa Que Eu Gamo. O bairro ainda tem outros blocos carnavalescos, como o Cardosão, o Xupa Mas Não Baba, o Volta Alice e o Bagunça Meu Coreto. Juntos, têm atraído milhares de foliões ao bairro, durante a festa de Momo.
Palácio Laranjeiras
Foi construído por Eduardo Guinle entre 1909 e 1914, no terreno que pertencia ao Conde Sebastião Pinho. Pouco depois, em 1926, o então presidente Washington Luís escolheu-o como residência oficial da Presidência da República – função transferida para o Palácio do Catete, após a ascensão de Getúlio Vargas, que, em 1943, transferiu a posse do Palácio Laranjeiras para o Governo do Estado do Rio de Janeiro.
Seus imensos jardins, transformados em parque, foram projetados pelo paisagista francês Gérard Cochet e, na década de 1950, reformulados por Roberto Burle Marx. Na época, também foi inaugurado um conjunto de três edifícios projetados por Lúcio Costa.
Em um dos apartamentos morou o poeta Vinícius de Moraes. Nele, foram compostas inúmeras músicas em parceria com Tom Jobim. Com seu toque modernista, o Parque Guinle é o recanto mais bucólico do bairro.